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Marcel Rizzo

Deyverson e Kepa escancaram como clubes da elite viraram reféns de atletas

Marcel Rizzo

25/02/2019 10h30

Deyverson deve ficar no Palmeiras apesar de proposta da China (Crédito: Alexandre Schneider/Getty Images)

Kepa Arrizabalaga se tornou há alguns meses o mais caro goleiro da história. O Chelsea pagou incríveis 80 milhões de euros (R$ 338 milhões) ao Athletic Bilbao pelo espanhol que, ao que parece, imagina ter agora licença para fazer o que bem entender no clube inglês. Ao se recusar ser substituído nos minutos finais da prorrogação na final da Copa da Liga Inglesa, contra o Manchester City neste domingo (24), Kepa se tornou mais um exemplo de atleta que faz do clube refém justamente porque o futebol de alto rendimento trata jogadores como bens, não como funcionários.

Em qualquer ramo de atividade um ato de insubordinação como de Kepa ao técnico Maurizio Sarri se transformaria, na maioria dos casos, em uma demissão. No futebol ele, no máximo, será multado. Logo após a partida, que teve o Chelsea derrotado nos pênaltis, o próprio Sarri já aliviou a barra do goleiro, que negou ter desobedecido — apesar de as imagens que correram o mundo mostrarem o contrário. Por que o técnico, que esbravejou esmurrando o banco de reservas após a recusa de Kepa, adotou um discurso moderado? Porque ele sabe que é o elo mais fraco na disputa contra um jogador que custou mais de R$ 330 milhões e que jamais será demitido.

No Brasil há um caso parecido ocorrendo neste exato momento. O Palmeiras quer vender Deyverson, que não quer ir para a China. Ele tem todo o direito de escolher onde quer jogar e pode recusar a negociação que renderia, no total, 12 milhões de euros (R$ 50 milhões) ao clube e parceiro. Mas seu histórico de temperamento imprevisível dentro de campo rendeu expulsões bobas que prejudicaram o time e que, na mais recente situação, gerou uma multa de R$ 350 mil por parte do clube e suspensão de seis jogos do tribunal desportivo por cusparada no corintiano Richard, no clássico do início de fevereiro.

O valor da multa, que seria altíssima a qualquer pessoas comum, não é para um jogador de futebol de elite e equivale mais ou menos a um mês de salário do atacante, menos até. A diretoria do Palmeiras o multou e, nos bastidores, o colocou à venda. Mas por que simplesmente não dispensá-lo? O clube teria prejuízo, já que gastou cerca de R$ 18,5 milhões, em julho de 2017, para contratá-lo do Alavés. Esse dinheiro, que teve participação da patrocinadora Crefisa, não seria reposto. Há também uma multa contratual que o clube teria que pagar ao atleta, claro, por romper o acordo. Mais gastos que, de uma certa forma, transformam o clube em refém do jogador. O clube não o quer mais, mas não pode mandá-lo embora porque terá prejuízo. Deyverson, ou Kepa, não são funcionários dos clubes, são bens.

A Lei Pelé, em 1998, disse que um jogador de futebol, ou desportista de alto rendimento em geral, não deveria ser mais um bem, acabando com o passe, que prendia o profissional ao clube eternamente no Brasil. Na prática não funcionou assim. Os clubes continuam considerando os atletas como bens, que valem muito dinheiro, mas ao final essa situação se voltou contra as equipes. Hoje, um jogador pode fazer o que quer, dentro ou fora de campo, que sabe que nada vai acontecer de mais sério a ele dentro da instituição. E nem adianta diretoria ou torcida palmeirense se irritarem com o vídeo-brincadeira de Deyverson na noite de domingo (24) pregando peça de que tinha aceitado a oferta da China, um dia depois de o técnico Felipão afirmar que ele ficaria. Nada vai acontecer.

Sobre o Autor

Marcel Rizzo - Formado em jornalismo em 2000 pela PUC Campinas, passou pelas redações do Lance!, Globoesporte.com, Jornal da Tarde, Portal iG e Folha de S. Paulo, no qual editou a coluna Painel FC. Cobriu Copas do Mundo, Olimpíada e dezenas de outros eventos esportivos.

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