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Marcel Rizzo

Não adiantou mudar a regra: jogadores continuam 'fatiados' pelos clubes

Marcel Rizzo

05/05/2017 04h00

Em 1º de maio de 2015 passou a valer a proibição da Fifa de que terceiros (pessoas físicas ou jurídicas) detivessem participação nos direitos econômicos de jogadores de futebol. A ideia era que, com isso, os clubes ficassem, na maioria dos casos, com 100% dos direitos de seus atletas, e com isso conseguissem receber valores maiores nas transações.

No Brasil, pelo menos, isso não aconteceu. Levantamento do blog mostra que os principais clubes brasileiros ainda têm a maior parte de seus elencos fatiados.

Mas como isso acontece se a Fifa não autoriza que terceiros detenham os direitos econômicos? A federação internacional proibiu que procuradores ou empresas desses profissionais participassem da fatia, mas é possível que clubes dividam os os direitos econômicos dos atletas – há também contratos mais antigos, de antes de 31 de dezembro de 2014, que ainda valem sob a regra anterior.

"A norma da Fifa proíbe que pessoas físicas ou jurídicas detenham direitos econômicos. Contudo, permite que os clubes continuem dividindo entre si a participação nestes direitos em caso de transferência futura de um atleta", explicou o advogado Eduardo Carlezzo, especializado em direito desportivo

Os grandes times brasileiros, portanto, continuam contratando seus jogadores em pedaços, deixando o restante com clubes de menor expressão. A Fifa costuma investigar para saber se um clube se enquadra como "laranja", ou seja, existe apenas para ter os direitos como forma de ocultar que, na verdade, há um investidor como verdadeiro dono.

É difícil, porém, identificar todos os casos, e mesmo comprovar que isso aconteça, principalmente se o time está em atividade, como na disputa de divisões inferiores dos estaduais.

Fatiados

Dentre os 12 maiores clubes do Brasil, oito apresentaram nos balanços financeiros de 2016 a divisão dos direitos econômicos dos atletas. Somente o Botafogo tinha, em dezembro de 2016, 100% de mais da metade dos jogadores profissionais.

Palmeiras, São Paulo, Santos, Flamengo, Fluminense, Grêmio e Cruzeiro tinham menos da metade, alguns bem menos, de 100% dos direitos econômicos daqueles sob contrato.

Agentes de futebol e cartolas ouvidos pelo blog disseram que apesar da mudança de regulamentação, a forma de se contratar, principalmente jovens atletas, continua a mesma: o alvo tem um procurador, que o registra em um clube de menor expressão, muitas vezes minúsculo, para manter seus direitos econômicos.

O clube grande, portanto, precisa negociar com esse time, e normalmente deixar parte desses direitos econômicos com o vendedor por dois motivos: primeiro porque quem vende pensa em um lucro maior no futuro, em caso de transação ao exterior, e segundo porque comprar somente parte dos direitos econômicos torna a transação mais barata.

Mas não somente clubes muito pequenos detêm essas participações. No Palmeiras, por exemplo, o atacante Roger Guedes, titular da equipe, tem 75% de seus direitos econômicos presos ao Criciúma, um dos grandes de Santa Catarina – o Palmeiras, portanto, detém 25%.

"O fatiamento dos direitos econômicos não é algo ruim, desde que seja utilizada de maneira correta, sem fraudes. Via de regra, o fatiamento é interessante, por proporciona que um clube compre um jogador por valor menor, mantendo parte dos direitos econômicos com o clube anterior. A partir daí, quando ocorrer uma venda, todos saem ganhando", disse o advogado André Sica, que deu exemplo de negociação recente do Palmeiras.

"É o caso do zagueiro Luan, que veio do Vasco com um compartilhamento dos direitos econômicos com o Palmeiras. Isso é bom, pois facilita a compra do atleta pelo Palmeiras, que não conseguiria pagar o valor integral, e é bom para o Vasco, pois ganha o dinheiro no ato da venda. Situação idêntica aconteceu na negociação envolvendo o Lucas Pratto entre Atlético-MG e São Paulo", afirmou.

Veja a fatia dos direitos dos atletas por clube em dezembro de 2016 (a diferença no número dos elencos é porque alguns times juntam na conta os atletas da base com contrato profissional, e outros separam)

Botafogo – 77 jogadores sob contrato – clube detinha 100% de 41 (53,2%)

Palmeiras – 33 jogadores sob contrato – clube detinha 100% de 16 (48,4%)

São Paulo – 93 jogadores sob contrato – clube detinha 100% de 43 (46,2%)

Flamengo – 105 jogadores sob contrato – clube detinha 100% de 35 (33,3%)

Cruzeiro – 86 jogadores sob contrato – clube detinha 100% de 19 (22%)

Santos – 36 jogadores sob contrato – clube detinha 100% de 8 (22%)

Fluminense – 125 jogadores sob contrato – clube detinha 100% de 24 – (19%)

Grêmio – 56 jogadores sob contrato – clube detinha 100% de 9 (16%)

Sobre o Autor

Marcel Rizzo - Formado em jornalismo em 2000 pela PUC Campinas, passou pelas redações do Lance!, Globoesporte.com, Jornal da Tarde, Portal iG e Folha de S. Paulo, no qual editou a coluna Painel FC. Cobriu Copas do Mundo, Olimpíada e dezenas de outros eventos esportivos.

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Notícias dos bastidores do esporte, mas também perfis, entrevistas e personagens com histórias a contar.