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Marcel Rizzo

Substituição por apenas 10 minutos. CBF tem projeto para alterar regra

Marcel Rizzo

27/06/2017 04h00

Há um projeto na CBF para se apresentar às entidades que ditam as regras do futebol que se crie uma substituição temporária. Na prática significa que um atleta machucado ficaria dez minutos fora de campo, outro entraria no seu lugar e, nesse período de tempo, se definiria se o lesionado volta ou sai definitivamente.

Isso seria usado principalmente após lesões na cabeça. A preocupação que cresce no futebol é com as concussões, que precisam ser avaliadas imediatamente após o choque em procedimento que pode demorar alguns minutos. Como é um machucado "invisível", muitas vezes os atletas que sofrem concussões voltam a campo para o time não ficar com um a menos, correndo risco de sofrerem problemas neurológicos graves.

Levantamento da CBF na Série A de 2016, com base em dados relatados pelos médicos dos clubes, mostra que as lesões nas cabeças foram as segundas mais comuns, com 9,69% — perdem apenas para as lesões na coxa, que lideram com 42,4%. Dos problemas na cabeça, a maioria (37,9%) foram concussões (11 casos relatados no Brasileiro da Série A do ano passado).

Teimosia

A concussão cerebral é a perda da consciência de curta duração, que acontece logo após um traumatismo craniano (bater com a cabeça). Ela caracteriza-se pela presença de sintomas sem nenhuma lesão identificada, mas com danos microscópicos, dependendo da situação, reversíveis ou não.

Álvaro Pereira é atendido durante jogo do Uruguai contra a Inglaterra na Copa de 2014 (Xinhua-19.jun.2014/Zhou Lei)

Essa ausência de lesões visíveis é o que faz com que muitas atletas que sofrem concussão em uma partida de futebol voltem a campo. Há casos famosos, como o uruguaio Álvaro Pereira, que na Copa do Mundo de 2014 sofreu uma forte pancada na cabeça na partida contra a Inglaterra, ficou desorientado, mas mesmo assim retornou ao jogo – quase exigindo isso ao médico e ao árbitro.

Dois meses depois, em agosto, em campo pelo São Paulo contra o Criciúma, Pereira caiu no chão, e bateu com força a cabeça no gramado. Também teve sintomas de concussão, mas novamente voltou à partida. Nas semanas seguintes ele passou por alguns testes, só sendo liberado a jogar quando foi constatado que não havia risco de algo mais grave.

"O jogador que sofre esse tipo de lesão fica desnorteado, e ele não sabe o que está acontecendo, muitos nem lembram a pancada que levaram, por isso querem continuar jogando, mas na verdade não têm ideia do risco que estão correndo", disse o médico Jorge Pagura, presidente da Comissão Nacional de Médicos de Futebol, subordinada à CBF.

Sem citar personagens, Pagura contou história de um jogo de Libertadores em que o árbitro chamou a campo o médico de um dos times. O profissional achou que seria expulso, mesmo sem motivo, mas ouviu do juiz que tirasse um jogador de campo que havia pouco sofrido uma pancada na cabeça. O médico avisou ao técnico, que questionou: "Mas por que vou tirá-lo, ele está bem".

"Ele está perguntando ao árbitro que jogo é esse, quanto está a partida e em qual estádio estamos", disse o médico ao treinador. O jogador deixou o campo, algo que, segundo Pagura, está se tornando mais comum hoje em dia. Há menos resistência de treinadores em retirar atletas que sofram pancadas na cabeça.

"Mesmo assim uma substituição temporária seria o ideal para evitar que o time fique com um a menos e se apresse a volta desse atleta que recebeu a pancada na cabeça. É algo que estudamos, mas não é simples mudar as regras do futebol. Já conseguimos alguns avanços, como os três minutos que o médico tem para fazer os procedimentos de avaliação de concussão e a liberação para que o médico entre em campo sem autorização do árbitro em caso de lesão na cabeça. Antigamente se o médico fizesse isso poderia ser expulso", disse Pagura.

O estudo da CBF, ao ser concluído, terá que ser enviado à Fifa e à International Board, entidade que é o órgão que regulamenta as regras do futebol. Eles precisariam primeiro aprovar a sugestão, depois colocar em teste para aí sim alterar os regulamentos. É algo que pode demorar anos.

Perigo

Para se diagnosticar a concussão são feitas algumas perguntas ao jogador para se identificar se há confusão mental. Os três minutos que hoje são liberados para se fazer os questionamentos em campo muitas vezes podem não ser suficientes para uma avaliação precisa – por isso a sugestão de substituição temporária por dez minutos. Na NFL, a liga profissional de futebol americano que tem vários casos de concussões, o procedimento de diagnóstico dura 15 minutos. Só que lá não há limite de substituições como no futebol (são três), portanto os times não ficam com um a menos nesse período.

"Essas pancadas na cabeça são algo que anos atrás não imaginaríamos que se tornaria frequente no futebol. O que aconteceu foi que hoje os atletas são mais fortes do que antigamente, quando o futebol era mais bonito de se jogar. Hoje os lances aéreos são constantes, o que abre mais possibilidade para pancadas na cabeça e o risco de doença grave", disse Pagura.

Como doença grave ele se refere à ETC. Foi nos EUA que se passou a ligar a encefalopatia traumática crônica a outros esportes que não apenas o boxe. A doença neurodegenerativa é causada por pancadas repetidas na cabeça, que se leva à perda de memória e falta de atenção, dor de cabeça e evolui para agressividade, confusão mental, podendo levar ao suicídio.

"Por isso é uma preocupação que o futebol precisa ter", disse Pagura.

Sobre o Autor

Marcel Rizzo - Formado em jornalismo em 2000 pela PUC Campinas, passou pelas redações do Lance!, Globoesporte.com, Jornal da Tarde, Portal iG e Folha de S. Paulo, no qual editou a coluna Painel FC. Cobriu Copas do Mundo, Olimpíada e dezenas de outros eventos esportivos.

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Notícias dos bastidores do esporte, mas também perfis, entrevistas e personagens com histórias a contar.