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Marcel Rizzo

Ainda ativo, comitê da Copa-2014 dá cargo remunerado a futuro chefe da CBF

Marcel Rizzo

20/09/2018 04h00

Em 30 de abril de 2018, três dias depois de ser banido para sempre do futebol pela Fifa acusado de corrupção, Marco Polo Del Nero cedeu à CBF pelo valor simbólico de R$ 1 sua cota de sócio na empresa denominada Copa do Mundo 2014 – Comitê Organizador Brasileiro Ltda, popularmente conhecida como COL (Comitê Organizador Local) e que teve como principal objetivo coordenar as ações para a realização do Mundial no Brasil.

Pouco mais de quatro anos e dois meses depois de a Alemanha bater a Argentina na final do torneio no Maracanã, o COL ainda existe, mas agora com somente um sócio, a CBF, um funcionário contratado, alguns consultores e com um novo diretor-presidente. Rogério Caboclo, também em 30 de abril, foi nomeado ao cargo, que é remunerado, substituindo Del Nero, segundo o contrato social da empresa a qual o blog teve acesso.

Caboclo é o presidente eleito da Confederação Brasileira de Futebol (assume em abril de 2019) e agora também responsável pela empresa que deveria ter sido extinta 18 meses após o final da Copa, portanto em janeiro de 2016, mas continua ativa devido a pendências judiciais (exceção para a dissolução que, diga-se, consta no contrato social). O cargo de diretor-presidente do COL prevê pagamento de remuneração mensal que em 2012, segundo o jornalista e blogueiro do UOL Juca Kfouri, era de R$ 110 mil. Questionado se Caboclo tem recebido pelo cargo que assumiu há pouco menos de cinco meses, o COL informou que "os profissionais que prestam serviços ao COL são remunerados na forma da legislação". Sem receita atualmente, o COL hoje paga suas contas ainda com dinheiro de sobra do Mundial, que ao fim da empresa terá que ser devolvido à Fifa.

Todos os ex-diretores-presidentes do comitê eram presidentes da CBF no exercício dessa função e acumulavam, portanto, as remunerações na confederação brasileira (de cerca de R$ 200 mil) e no COL, o que não é ilegal. Ricardo Teixeira foi o primeiro, de 2008 a 2012, José Maria Marin o segundo, de 2012 a 2015, e Del Nero o terceiro, de 2015 até 30 de abril de 2018, quando cedeu o posto a Caboclo.

Todos também deixaram a presidência da CBF, e por consequência a chefia do COL, por suspeitas de corrupção. Marin foi condenado pela Justiça dos EUA, no fim de agosto, a quatro anos de prisão por receber propina em transações de direitos comerciais de campeonatos de futebol, mesmas acusações que pesam sobre Teixeira e Del Nero. Eles negam irregularidades.

O atual presidente da CBF é Antônio Carlos Nunes, vice que assumiu o complemento do mandato depois que Del Nero foi banido. Pela lógica, portanto, ele seria o sucessor de Del Nero também no COL, mas a CBF optou por colocar Caboclo, que hoje ocupa o cargo de diretor-executivo da confederação e quem, de fato, comanda a entidade. Segundo o COL, essa decisão ocorreu porque Caboclo foi o dirigente da CBF que acompanhou o comitê mais de perto desde antes da Copa do Mundo.

Desde agosto de 2016, ao menos, Caboclo já assinava em lugar de Del Nero como seu representante em documentos do Comitê Organizador, como mostrou o blog em matéria de janeiro de 2017. No contrato social alterado em 30 de abril assinam pela CBF Nunes, o diretor jurídico Carlos Eugênio Lopes, o diretor financeiro Gilnei Botrel, além de, claro, Marco Polo Del Nero, que estava deixando a sociedade e o cargo de diretor-presidente.

Há outro detalhe: entre dezembro de 2017 e abril de 2018, Del Nero esteve suspenso de atividades do futebol enquanto era investigado pelo comitê de ética da Fifa, e mesmo assim se manteve no cargo do COL. Apesar de ser uma empresa que efetivamente não tem mais atividades, não deixa de estar relacionada ao futebol já que atua na esfera jurídica com fornecedores da Copa do Mundo de 2014. O blog apurou que, como a sentença de Del Nero já foi definida com o banimento (a pena mais alta, portanto), a Fifa não pretende tomar esse período que ele ficou no cargo enquanto suspenso como algo a ser investigado.

Até abril, a CBF detinha 99,9% das cotas do COL, e Del Nero 0,01%, justamente a que cedeu a R$ 1. Segundo a nova redação do contrato social, a CBF é a única sócia do COL, mas há um parênteses para não ir contra o Código Civil: em até 180 dias contando a data da assinatura das alterações, ou seja, até 30 de outubro próximo, o COL precisa definir se manterá apenas um sócio, transformando-se em empresa individual de responsabilidade limitada (Eireli), ou se apresenta um novo sócio. Que poderia até ser o próprio Rogério Caboclo — segundo o COL, ainda não há uma decisão sobre o que será feito e isso está em discussão com a Fifa.

O COL informou que a decisão de colocar apenas a CBF como sócia foi tomada porque a presença de membro da confederação sempre se deu exclusivamente por conta da necessidade de pluralidade de sócios, conforme as regras aplicáveis então às sociedades limitadas. No entanto, com a nova regulamentação vigente, não há mais essa necessidade. Também disse não saber quando será feita a dissolução da empresa, porque ainda existem processos em curso para finalizar essa fase de desmobilização. Há somente um funcionário contratado e alguns consultores prestando serviços ao COL, informou a assessoria do comitê.

O COL

O problema para a dissolução do Comitê Organizador da Copa-2014 continua o mesmo informado em outras ocasiões: há processos judiciais em andamento, principalmente com relação a terceirizados que prestaram serviço durante a Copa. A empresa conta com uma estrutura jurídica para cuidar desses assuntos.

A Fifa gastou um total de US$ 453 milhões (R$ 1,8 bilhão em cotação atual) com o COL, entre contratos com pessoal, segurança, operação de estádios, entre outros, entre junho de 2008, quando a empresa foi criada, e dezembro de 2014, quando a entidade que comanda o futebol diz ter encerrado atividades relacionadas à Copa-2014 . Pelo contrato social do COL, após sua dissolução o dinheiro que sobrar será devolvido à Fifa e não poderá haver divisão do lucro entre os sócios que, por enquanto, é apenas a CBF.

Sobre o Autor

Marcel Rizzo - Formado em jornalismo em 2000 pela PUC Campinas, passou pelas redações do Lance!, Globoesporte.com, Jornal da Tarde, Portal iG e Folha de S. Paulo, no qual editou a coluna Painel FC. Cobriu Copas do Mundo, Olimpíada e dezenas de outros eventos esportivos.

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Notícias dos bastidores do esporte, mas também perfis, entrevistas e personagens com histórias a contar.