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Marcel Rizzo

Pioneiro dos testes, levantamento mostra Brasil para trás no uso do VAR

Marcel Rizzo

09/11/2018 04h00

O árbitro Wagner do Nascimento Magalhães consulta o VAR na final da Copa do Brasil (Crédito: Marcello Zambrana/Agif)

Dos seis países precursores nos testes do árbitro de vídeo (VAR, na sigla em inglês), o Brasil é o único que ainda não tem a tecnologia em seu principal campeonato nacional e aquele que menos realizou partidas com a possibilidade de revisão da arbitragem por imagens. Dos 20 países que já usaram o VAR alguma vez de 2016 até agora, o Brasil só o utilizou mais vezes do que um deles, o Qatar.

Os números estão em um levantamento produzido pela Ifab (International Football Association Board), a associação que regula as leis do futebol e que, em março de 2018, incluiu o árbitro de vídeo nas regras do esporte depois de quase dois anos de testes. No início dessa semana, em um encontro em Londres, na Inglaterra, membros da Ifab dissecaram um mapa de onde a tecnologia está sendo utilizada.

No Brasil, até agora, foram somente 18 jogos com a possibilidade de rever lances que originaram gols, pênaltis e advertências pelo sistema de vídeo, entre 2017 e 2018: 14 da Copa do Brasil e dois de estaduais (Rio Grande do Sul e Santa Catarina) esta temporada, além dos dois confrontos finais do Campeonato Pernambucano, ano passado, quando o sistema ainda estava em teste.

Alemanha, Holanda, Austrália, EUA e Portugal, que com o Brasil ganharam o direito, em junho de 2016, de testar o VAR,  já usam o sistema em seus principais campeonatos nacionais, além de amistosos e confrontos de copas (torneios mata-mata). Somente a Alemanha, ao final da Bundesliga, sua primeira divisão, em maio de 2019, terá tido o VAR em 686 partidas — 38 vezes mais do que no Brasil.

O levantamento mostra que 20 países, além da Fifa, da Conmebol (Confederação Sul-Americana de Futebol) e da CAF (Confederação Africana), usaram o VAR "ao vivo", como a Ifab se refere ao procedimento em que há comunicação entre os árbitros principal e de vídeo com possibilidade, portanto, de alteração de marcação dentro de campo. São eles Alemanha, Austrália, Bélgica, Brasil, China, República Tcheca, Inglaterra, França, Itália, Coreia do Sul, México, Holanda, Polônia, Portugal, Qatar, Arábia Saudita, Espanha, Turquia, Emirados Árabes e EUA.

O Qatar, com oito jogos, todos na Copa do Emir é o que utilizou menos, seguido do Brasil (18). Até o México, que jamais participou de conversas e testes prévios do VAR, teve uso até agora em 27 partidas de seu campeonato nacional com o VAR. A Holanda, que com Brasil e Alemanha foi uma das três primeiras confederações a debater o árbitro de vídeo, já tem previstos 336 partidas até meados de 2019. Para o ano que vem, há confirmação de uso do VAR no país de 14 jogos no Campeonato Paulista, outros dez no estadual do Rio e seis no mineiro. Federações do CE, PB, SC, GO, RS e BA querem, mas precisam de autorização da Ifab. Para o Brasileiro da Série A vai depender do aval dos clubes que, como em 2018, debaterão principalmente sobre os custos. A CBF diz que estará pronta para dar condições de árbitro de vídeo na Série A e novamente na reta final da Copa do Brasil.

"As providências em diversas áreas estão sendo tomadas com a CBF investindo forte para disponibilizar o sistema. Em 2018, os clubes não aprovaram, mas nunca paramos de nos preparar. Tanto que foi feito na Copa do Brasil", disse Sérgio Corrêa, coordenador do VAR na CBF.

Correa disse que houve todo um protocolo a se seguir da Ifab, com fases a se cumprir para os testes. Foi somente no segundo semestre de 2017, antes ainda de incluído nas regras do futebol, que foi liberado o uso em escala maiores de jogos, mas ainda em fase de observações. "Não poderíamos fazer sem ultrapassar todas as fases", disse ele.

Pioneirismo não adiantou

O VAR passou a ganhar forma em 2015. Três países enviaram sugestões a Ifab e Fifa sobre como regular o uso do vídeo no futebol: Alemanha, Holanda e Brasil. Em setembro de 2015, a CBF tentou a liberação para testar o modelo que considerava ideal, mas recebeu um não – modelo que, entre outros pontos, não apresentava um monitor na beira do campo para o árbitro principal rever a jogada, mas apenas as imagens nas cabines e os auxiliares de vídeo informando, por rádio, o que analisaram das jogadas. A CBF ainda entende que a tela no campo fez o jogo perder muito tempo, mas o modelo do VAR adotado foi o sugerido pela Holanda.

Em março de 2016, a Ifab aprovou que fossem realizados testes e três meses depois, em junho, deu o aval para apenas seis países: Alemanha, Portugal, Holanda, Austrália, EUA e Brasil. Naquele ano, porém, somente holandeses (cinco partidas amistosas) e americanos (dois amistosos) testaram de fato a tecnologia  100%, com a cabine entrando em contato com o árbitro principal e lances podendo ser modificados — no Brasil houve testes em off, sem possibilidade de alterar decisões de campo, nas finais do Campeonato Carioca. Em dezembro, a Fifa estreou no mundo tecnológico em seu Mundial de Clubes, no Japão, com oito confrontos, todos com o VAR.

No ano seguinte, 2017, outros 11 países usaram o VAR, em escalas diferentes: Austrália, Bélgica, Coreia do Sul, Alemanha, Itália, Portugal e EUA o adotaram em jogos de seus principais campeonatos nacionais, no caso dos australianos e europeus a partir do segundo semestre, quando se deu o início da temporada 2017/2018. Os americanos passaram a usar na parte final da Major League Soccer (MLS), sua liga profissional, e os coreanos durante toda sua primeira divisão, entre julho e novembro.

Outros países, como França, República Tcheca, China, Brasil e Polônia, além da Holanda, utilizaram em algumas partidas, principalmente de Copas ou amistosos — os poloneses, no fim do ano, decidiram que o VAR seria utilizado em todo o segundo turno de sua divisão de elite. Por aqui foram os dois jogos da final do Campeonato Pernambucano, entre Sport e Salgueiro.

Para 2018, se esperava que o VAR, introduzido de vez nas regras do futebol em março e confirmado para a Copa do Mundo da Rússia, seria integrado ao Campeonato Brasileiro da Série A. Só que em fevereiro, durante o Congresso Técnico da competição, a maioria dos clubes participantes vetou o uso da tecnologia. O principal motivo para a recusa foi o custo, de cerca de R$ 50 mil por partida, que teria que ficar a cargo dos participantes. A CBF também daria as condições de uso somente para o segundo turno (por questões de profissionais habilitados e compra de equipamentos). Ao final, portanto, haveria um custo total de quase R$ 10 milhões, considerado alto.

No mundo, porém, houve avanço no uso do VAR. Mais sete países passaram a utilizá-lo e as ligas da China, França, Turquia, Holanda e Espanha passaram a ter o VAR em suas primeiras divisões. A Inglaterra, berço das regras do futebol como conhecemos e que tem o pé atrás com os equipamentos, iniciou-se na tecnologia em jogos da Copa da Inglaterra e da Copa da Liga Inglesa, enquanto a Premier League, que organiza a primeira divisão local, ainda avalia quando passará a ter os vídeos. A Uefa, também contrária inicialmente, já avisou que a Liga dos Campões, o campeonato de clubes mais importante do mundo, terá o VAR a partida da próxima temporada, a 2019/2020.

Para 2019, a Ifab avalia que ao menos dois outros países passem a usar a tecnologia, a Suíça, onde está a sede da Fifa, e Israel, além de outros países da Ásia (como o Japão). Até a Copa do Mundo de 2022, que será no Qatar, espera-se que até 50 possam adotar as câmeras como forma de corrigir erros de campo em jogos de seus campeonatos.

A Fifa, até o momento, organizou 148 partidas com VAR em suas competições — na Copa do Mundo da Rússia, na Copa das Confederações-2017, no Mundial Sub-20 de 2017 na Coreia do Sul, e em dois Mundiais de Clubes (2016 e 2017). A Conmebol usou em 36 partidas, entre Libertadores, Copa Sul-Americana e Recopa, e a Confederação Africana em duas de sua Liga dos Campeões.

Sobre o Autor

Marcel Rizzo - Formado em jornalismo em 2000 pela PUC Campinas, passou pelas redações do Lance!, Globoesporte.com, Jornal da Tarde, Portal iG e Folha de S. Paulo, no qual editou a coluna Painel FC. Cobriu Copas do Mundo, Olimpíada e dezenas de outros eventos esportivos.

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